Para combater problemas causados pela coagulação do sangue, como a trombose, médicos prescrevem antitrombóticos. O medicamento impede a formação de placas sólidas do fluido em vasos sanguíneos, mas carrega um risco: o de desencadear sangramentos ininterruptos. Pesquisadores dos Estados Unidos desenvolveram um anticorpo que não causa esse perigoso efeito adverso. Detalhes do trabalho foram divulgados na edição desta semana da revista Science Translational Medicine.
“A trombose é a causa proximal da maioria dos enfartes do miocárdio, dos derrames e de outros eventos cardiovasculares. É uma grande precedente de mortalidade. Drogas antitrombóticas diminuem a trombose, mas prejudicam a hemostasia (mecanismo que cessa a perda de sangue de um vaso danificado). Por isso precisamos de uma opção melhor, que tenha tanto eficácia quanto segurança”, justificaram os autores no artigo.
Liderada por Shaun Coughlin, pesquisador do Centro de Pesquisa em Câncer Hellen Diller (EUA), a equipe desenvolveu um anticorpo que consegue inibir uma das proteínas responsáveis pela coagulação, o fator de coagulação XI (FXIa). A nova droga se liga ao fator XI e bloqueia sua atividade enzimática, evitando o sangramento. “Nossa intervenção bloqueou a função FXIa ativa no local, mas não se ligou a outros mecanismos de coagulação, não causando, assim, efeitos secundários”, explicaram os autores no trabalho.
Os cientistas testaram a droga em ratos, coelhos e macacos. A substância não provocou sinais de hemorragia nas cobaias, mesmo quando elas receberam doses mais altas do que as necessárias para evitar a coagulação. “Ela não aumentou o sangramento em coelhos induzidos a ter trombose e não causou hemorragia espontânea em macacos durante um estudo de duas semanas”, detalharam.
Para Ricardo Chaves Machado, Hematologista do Hospital Santa Lúcia e do Hemocentro de Brasília, o uso do fator de coagulação XI é o grande diferencial do trabalho norte-americano. “São muitos os elementos envolvidos na coagulação do sangue. O fator XI foi uma escolha interessante porque ele não causa muitas consequências no sangramento comparado a outros fatores, como o VIII e o IX, que são os mecanismos que geram problema para os hemofílicos”, explicou.
O especialista também destaca que, caso se repitam em testes futuros, os resultados podem trazer um grande ganho para a área médica. “Aparentemente, é um grande avanço. Por exemplo, tenho pacientes que usam medicamentos anticoagulantes que já causaram problemas como sangramento intestinal. Eles se beneficiariam com uma opção melhorada. Precisamos ter cautela com os resultados, mas a diminuição de reações adversas é importante e contribuiria de forma muito positiva para tratamentos.”
Antídoto
Os investigadores desenvolveram um segundo anticorpo que serve como uma espécie de antídoto: reverte rapidamente a atividade do primeiro. A substância também foi testada em animais e obteve sucesso. Machado destaca que uma opção que anule o efeito do anticorpo anticoagulante é uma estratégia necessária. “Se uma pessoa toma esse medicamento, mas sofre um acidente de carro e precisa reverter esse efeito, essa droga é necessária para que ela possa receber o tratamento adequado”, detalhou.
Os autores darão continuidade ao trabalho e acreditam que outros testes com a nova droga poderão ajudar a trazer mais informações quanto ao fator de coagulação estudado. “Esse anticorpo específico, além de ter bloqueado a trombose em modelos animais, pode nos ajudar, em conjunto com sua versão de reversão, a explorar melhor os papéis do fator XI em outras enfermidades humanas”, concluíram.
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